Quando
se fala em vícios, logo vem à mente processos ligados ao comportamento comum do
homem, entretanto, neste espaço vamos abordar alguns vícios ligados ao trabalhador
espírita.
Com
um processo de dogmatismo e ritualismo impregnados até a alma, frutos de uma
cultura religiosa católica inserida na Doutrina Espírita quando esta começou a
desenvolver-se no Brasil, que em união às outras manifestações religiosas
legou-nos um exacerbado misticismo.
A
possibilidade de falar com os mortos e manter vivo o dogma dos santos e da
salvação da alma encantaram os que aderiam ao Espiritismo e não tardou o endeusamento de espíritos que traziam
mensagens bonitas, escritas ou faladas, e que tocavam o mais modesto dos egos.
Logo, a crença de que estes são espíritos enviados por Deus para guiar os
homens na Terra tomou conta das mentes incautas que ainda nos dias atuais, se
estonteiam de prazer ao ouvir o que chama de espírito guia, dizer-lhes que são
os mais autênticos e melhores trabalhadores que a Doutrina já tivera. Tão
sapientes que poderiam inclusive, reformar o Espiritismo com a mesma capacidade
de Kardec.
A
Doutrina Espírita não adota altares, mas os espíritas descobriram uma forma de erguê-los:
as paredes dos centros encontram-se repletas de fotografias, são verdadeiros
painéis votivos dispostos ao culto.
Retratos
de pessoas vivas ou não ao gosto dos que se predisponham à veneração:
presidente da casa, amigos desencarnados, figuras católicas como João Paulo II,
Madre Tereza de Calcutá e agora também Irmã Dulce, patrocinadores da casa, vultos
do espiritismo: Bezerra de Menezes, Sheilla, Cairbar Schutel, Eurípedes
Barsanulfo, Divaldo Franco, Francisco Cândido Xavier, André Luiz, Emmanuel, Allan
Kardec. A lista é tão extensa quanto fervoroso é o culto, faltando apenas
ajoelhar e benzer-se.
Outro
vicio é atribuir até mesmo a um espirro, a presença de um obsessor. Ai de quem
chegue a um centro, onde o dogmatismo domine com uma dor de barriga ou de
cabeça, imediatamente é enviado à desobsessão... Aliás, para os espíritas
apegados à obsessão, toda e qualquer pessoa, esteja ela rindo, contrita ou
doente já indica que tem um obsessor ou obsessores.
A
reunião de desobsessão que deveria servir para o equilíbrio, tanto de
encarnados, quanto de desencarnados, tornou-se a catarse coletiva em que
encarnados são sempre vitimas e desencarnados, os eternos algozes, banidos para
cárceres nos submundos e até mesmo amarrados por entidades consideradas
poderosas e que segundo os médiuns da casa, não voltarão a molestar sua vítima.
Médiuns
se contorcem, grunhem, batem na mesa, jogam-se ao chão, rodam pela sala... Tudo
sob o astuto olhar do dirigente que aplaude o espetáculo e reitera, em pleno
século XXI, que ali se encontra os melhores médiuns da praça.
Não
podemos esquecer nesse conjunto, o vicio do passe e da água fluidificada. Estas
estão no mesmo patamar de beatitude das entidades, melhor dizendo, bentas.
Consideradas sagradas, que curam qualquer mal, não se deve sair do centro sem
antes ser ungido, digo, sem tomar o passe, sempre com as mãos espalmadas para
cima e se o médium não soprar os ouvidos, alisar o paciente e estiver
incorporado o passe não serviu, é considerado fraco e, portanto sem efeito.
A água fluidificada virou um item comercial,
em alguns centros ela é vendida e vem em garrafinha personalizada com o
logotipo da casa em um sinal de que a venda de indulgências não ficou no
passado.
Achando
pouca toda esta paranoia, inauguramos a era dos tratamentos onde toda atividade
da casa se volta para a mesma temática, nos quais médiuns tentam toscamente
imitar Arigó.
Os tratamentos recebem nomes diversos, mas
todos tem a mesma linha de trabalho: fluidoterapia, passe espiritual,
evagelhoterapia, cromoterapia, tratamento dos chakras e o que pode ser o mais interessante
de todos, a cirurgia do perispírito, na qual, o perispírito é retirado do
paciente para submeter-se ao tratamento cirúrgico e depois, fantasticamente
recolocado de volta em seu dono.
Estes
tratamentos são vips e altamente recomendados pelos médiuns e dirigentes que se
encontram à frente destes trabalhos e tem ligação direta à desobsessão, o
problema é que estes trabalhadores não percebem que eles deveriam ser os
primeiros e principais pacientes de uma desobsessão.
A leitura do Evangelho, sem a interpretação e entendimentos necessários ao
progresso do espírito praticamente não existe nas casas com estas
características e não há recomendação deste aos frequentadores. Mas, as pomadas
e receitas de chás e homeopatias são distribuídas sem constrangimentos para
quem dá e para quem recebe que sai do centro com a mesma ostentação dos fiéis
que no passado recebiam dos religiosos pedaços de roupas que diziam ser uma
relíquia sagrada pertencente ao Cristo.
Como
podemos classificar esse comportamento dos que se dizem espíritas se o
Espiritismo não impõe regras, dogmas e não prega ritualismos?
Os
mais afoitos dirão que isso é uma exteriorização das experiências de uma vida
passada, porém, estamos hoje vivenciando a Doutrina Espírita e, portanto
precisamos ter a hombridade de respeitá-la.
Em analogia a Fernando Pessoa, estudar é preciso tanto quanto navegar, e
só o estudo para alertar sobre esse processo de supervalorização das sombras em
detrimento dos valores espirituais positivos.
Espírita
que não estuda não deveria considerar-se como tal, mas apenas como um mero
aspirante, pois este comportamento vicioso demonstra contradição com os
princípios do Espiritismo. Nada tem de
revolucionário este comportamento, assim como prega a Doutrina, pois apenas
repete formulas do passado dando a elas o nome de espírita.
O
engodo é levado a efeito com o intuito de endeusar médiuns e dirigentes que se
utilizam do Espiritismo para aparecer socialmente e obter favores pessoais. Os
caras de pau ainda alardeiam publicamente que tudo o que fazem é pelo bem das
pessoas e pela divulgação do Espiritismo. Sem dúvidas, o Espiritismo não precisa
de uma divulgação que o destrata, desvirtua e leva-o ao descrédito.
Somos
todos aprendizes é certo, mas cruzar os braços aos estudos da codificação que
nos leva a conhecer e entender a Doutrina e abarrotar as casas espíritas de
invencionices e achismos numa mistureba religiosa fanática e ritualística é faltar
ao compromisso com a causa espírita que deve e precisa ser divulgada de modo
coerente e organizada.
Sem
o equilíbrio necessário as conveniências pessoais aliadas à insensatez transformam
a Doutrina Espírita em mais uma seita anárquica de alienados.
No capítulo XVII, item Os bons espíritas de o Evangelho
Segundo o Espiritismo, os espíritos advertem que há os que acreditam nas
manifestações, mas não compreendem as consequências, nem o alcance moral ou
mesmo que tenha a compreensão não aplicam a si mesmos, e isto não se atribui a
uma falta de clareza da Doutrina, pois esta não contém alegorias e nem figuras
que possam dar margem a falsas interpretações.
Logo,
devem-se esses fatos a entendimentos pessoais, como disse Kardec em Obras
Póstumas, a ignorância das Leis leva o homem a procurar causas fantásticas para
os fenômenos que não compreende e estas são as bases das superstições que são
atribuídas aos fenômenos espíritas.
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